“O inferno são os outros”
Jean-Paul Sartre (1905-1980)
Ribeirão Preto, São Paulo, 24 de agosto de 2024. Imagens aterradoras seguidas de relatos de fugas desesperadas, oxigênio a céu aberto quase inexistente e sob ataque de nuvens negras rasantes oriundas de uma fumaça sufocante e sensação de pavor da morte, além da falta de ar iminente.
O Brasil vem sendo tragado desde o último final de semana por notícias de incêndios simultâneos com ares criminosos e mortes derivadas da calamidade ou criminalidade naquele estado. Até o momento, seis suspeitos foram presos. Todos podem responder por incêndio criminoso.
Também varreram o país e o mundo imagens de pastos, regiões do cerrado pantaneiro e da floresta amazônica brasileira ardendo em altas temperaturas e labaredas destruidoras de pulmões, plantações e vidas anônimas prejudicadas pela tragédia ambiental e/ou atos criminosos dos bandidos impunes que andam soltos por aí.
Queimadas essas em larga escala que assustaram e revoltaram quem as viu nas TVs e redes sociais, restando aos brasileiros de bem o sentimento de solidariedade para com as vítimas. Fica a reflexão sobre como qualquer de nós se comportaria diante de situações limites e desesperadoras como essas, particularmente filmadas em Ribeirão Preto.
Pará
Na noite desta terça-feira, 27, sob a justificativa de que
notas técnicas emitidas pelo Cemaden e Semas, respectivamente, o Centro
Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais e a Secretaria de Meio
Ambiente e Sustentabilidade do Pará, registraram o aumento de 40% dos focos de
queimadas no estado em comparação a 2023, o governador Helder Barbalho assinou
decreto de emergência ambiental no estado.
O ato do executivo proíbe que se realizem queimadas em todo o território paraense onde, somente em agosto, foram identificados cerca de 6.600 focos de incêndio. O decreto prevê sanções penais, civis e administrativas para quem descumpri-lo, cuja vigência inicial será de 180 dias.
“Vilã”
Segundo especialistas de Cemaden e Semas, as consequências
do “La Niña” têm sido ainda mais severas em 2024, promovendo uma “escassez
hídrica”, eufemismo para seca, bem como desastres ambientais e incêndios em
vários pontos da floresta amazônica.
A eles se associam ongueiros, “entendidos e demais palpiteiros” quando o assunto é aquecimento global ou mudanças climáticas, ambos outros notórios vilões que estariam na raiz do problema.
Estariam, porque para outras correntes não menos competentes e especializadas, o buraco, no caso, o fogo, é mais embaixo e vem longe.
Prevenção
“Para esses ‘entendidos’, a culpa sempre é da natureza. É
muito mais fácil se eximir de qualquer responsabilidade em assunto do qual
demandam ações preventivas, na medida em que, de tempos em tempos, com a
ocorrência das longas estiagens, os períodos sem chuvas, as secas e queimadas
se tornam consequência desses fenômenos”, revela doutor em ciências da natureza
com décadas de experiência e muitas secas e queimadas sob o seu olhar e radar
sempre atentos.
Brasil queimado
Só em 2024, o Brasil já registrou mais de 109 mil focos de incêndios. Em
relação a 2023, a alta é de 78%, uma das maiores desde que se passou a aferir a
incidência das queimadas. Em menos de um mês, foram identificados mais de 50
mil focos, a maioria no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará e Amazonas.
Dino na área
Para atuar no combate aos incêndios nesses quatro estados, o
ministro Flávio Dino (STF), deu prazo de quinze dias para que os ministérios da
Defesa, da Justiça e do Meio Ambiente mobilizem o efetivo necessário de agentes
federais (PF), da PRF, Força Nacional.
A decisão do ministro é relativa a ação judicial patrocinada pelo partido da ministra Marina Silva, o Rede Sustentabilidade, cujo texto pede medidas contra incêndios provocados por “fazendeiros, garimpeiros e grileiros” acusados de promover queimadas o ano inteiro.
Recordes negativos
No 1º de julho foi revelado, de acordo com dados capturados
por satélite, que o Brasil registrou mais de treze mil focos de incêndio na
Amazônia só no primeiro semestre, o que equivale a um aumento de 61% em
comparação a 2023. O número é o pior dos últimos vinte anos, desde que os dados
começaram a ser revelados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
(INPE).
Menos de um mês depois, em agosto, o fogo consumiu cerca de 2,5 milhões de hectares na região. Os números foram divulgados pelo Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA/UFRJ).
2ª feira negra
Em matéria de incêndios, 26 de agosto foi considerado o pior dia do ano.
Dados do INPE registraram quase dois mil focos de calor. Desde o começo de
agosto, foram cerca de 27 mil.
Ação e resposta
"Do Ministério do Meio Ambiente, passando por Ibama e outros tantos órgãos e
autarquias em âmbito federal, o que mais falta é gente preparada e
especializada capaz de emitir alertas, realizar campanhas educativas e coibir
os grupos que promovem incêndios ilegais e criminosos. Agora, diante da
tragédia, é fácil fazer o jogo de empurra e transferência de responsabilidades,
quando o mais importante seria ter a capacidade de ação, de respostas aos
incêndios, como forma de controlar ou mitigar os sinistros”, afirma o
especialista.
Oráculo
Uma espécie de oráculo sobre o tema, o cientista experiente e incansável
estudioso, encerra sua peroração com a afirmação - lição - de Sartre sobre o
inferno serem os outros e a eterna e impune omissão.
No que somos instados a concordar e anotar mais essa lição, não da natureza, a vítima transformada por alguns em vilã, mas aquela proferida pelo sábio pesquisador e caboclo da nossa terra.
Siga o Podcast do Amazônico no YouTube
@podcastdoamazonico - Instagram
podcast do Amazônico - Facebook